Chief Strategy Officer na LOLA MullenLowe
“Sempre olhe para sua trajetória, para a forma com que está se desenvolvendo, se está está crescendo com ou sem estofo.”
Meu psicanalista me falou a frase acima há mais de 6 anos. No começo, não entendia muito seu real significado. Com o passar do tempo, fui amadurecendo a ideia e hoje acho que entendo melhor. O fato é que essa frase me pegou em cheio desde então.
Estofo. Essa palavra vem me assombrando. Ela sempre aparece no meio de uma reunião importante. Ela me persegue quando viro uma noite trabalhando. Ela vem e volta como um carrasco que insiste em me caçar por todo lado. Ela me dá um tapa na cara a cada conquista ou promoção que tenho.
Estofo. Seu significado formal é ‘tecido, lã, estopa ou qualquer material que preencha uma poltrona, sofá ou mobiliário’. Ao mesmo tempo, é uma palavra que inspira muitas analogias para nosso mundo do planejamento.
Trabalho em planejamento há pouco mais de 12 anos e é impressionante ver as mudanças pelas quais nossa área passou nesse tempo. Quando comecei, esta era um departamento de pesquisa e análise. Depois, passou a se envolver com discussão de posicionamento de marca. Mais tarde, com conceito criativo. Recentemente, com pensamento de canais. Tudo isso elevou o planejamento a um status nunca antes visto. Fantástico!
Aparentemente, estamos construindo um puta estofo para o planejamento, certo?
Errado!
A questão é, na minha opinião, o planejamento cresceu sim, se tornou importante sim mas fez isso tirando estofo. Ou cresceu adicionando um estofo imaginário no ‘sofá’ planejamento em que sentamos. Explico.
A estratégia que o planejamento usou para crescer foi ir negando coisas, matando uma a uma as bolas de estofo que considerávamos velhas e ultrapassadas.
Matamos o estofo da pesquisa, que consideramos chata e quadrada.
Queimamos, a sangue frio, os estofos de negócio e resultado com a bandeira da ‘criatividade pseudo-moderna’.
Jogamos água no estofo referente aos outros 3 P’s do marketing simplesmente porque não são mais interessantes.
Pior, negamos todo estofo dos nossos clientes os julgando pela sala de reunião.
No lugar de todo esse estofo perdido, criamos um puta discurso lindo de ‘planejamento criativo’, que nega qualquer assunto que não seja cool o bastante.
E criamos um estofo imaginário, que é construído com textos lindos num case de 2.000 palavras bem escritas, com a jornada heróica de um ‘planejador contra o mundo’ para provar seu valor. Um estofo inventado, que cabe mais a um romance do que a vida real.
Criamos uma bolha imaginária e vazia, que vai explodir a qualquer momento.
Esse cenário criou dois reflexos diretos:
1) Jovens planejadores querendo crescer cada vez mais rápido e da forma errada: através de prêmios em que o discurso vazio e bem escrito vale mais que o estofo conquistado com muito tempo e tapa na cara.
2) Clientes que já perceberam essa bolha vazia e que estão terceirizando o trabalho estratégico para outros tipos de empresas. Vejo muitas consultorias substituindo o planejamento de agências, muitos institutos fazendo recomendações estratégicas consistentes, muita gente inteligente criando mais estofo para reinventar seus negócios do que planejadores. E não me entenda mal, não os vejo como ameaça mas como inspiração.
São sintomas importantes na minha opinião e que estão fazendo as agências cada vez menos relevantes para o pensamento estratégico das marcas. Mas não quero discutir aqui o futuro das agências, mas como isso impacta cada um dos planejadores da nova geração.
A grande questão é: O que fazer para encher nosso ‘sofá planejador’ com mais estofo?
Acho que os planejadores devem pensar em diversificar seu conhecimento com diferentes tipos de estofo. Para os novos, o diferente pode ser resgatar o conhecimento de pesquisa, negócio, marca, distribuição etc. Pode ser ir tentar trabalhar fora do Brasil, conhecer novos jeitos de pensar. Vale a pena!
Para outros, pode ser aprender coisas novas, aprender a pensar estrategicamente outras áreas de negócio, dentro ou fora de agência. Pensamento estratégico pode ser aplicado em várias áreas da vida, tendo um negócio próprio como em outros tipos de empresa. Não importa que caminho você escolha, o importante é encher seu sofá com estofos de outras cores. O Grupo de Planejamento tá aí para ajudar. O Unplanned também. Que tipo de estofo você acha que os planejadores mais precisam?
Venho me perguntando isso há algum tempo. Por isso, estou tentando encher o meu sofá com coisas novas. Por conta disso, depois de 12 anos de agência, acabei de aceitar uma proposta para ser cliente. Ainda não sei o que terei de bom ou ruim mas, com certeza, vou acumular um novo tipo de estofo.
Brigado, Bachir! (meu terapeuta :- )