Fundador do Unplanned e Diretor de Planejamento na F/Nazca Saatchi Saatchi
É verdade que nós sempre gostamos de você.
Esse jeito construiu nossos heróis, nos fez trabalhar com estratégia, criou trabalhos e marcas memoráveis, foi a razão de acordar e trabalhar todos os dias pra sermos protagonistas dessa sua história. Também é bem verdade que você ajudou no “blá blá blá” que o mercado absorveu, nas consultorias de vento, na veiculação de manifestos e etc. Mas, em geral, você fez bem e foi muito feliz. Deixou um legado importante e soube ajudar a conduzir o mercado e suas marcas até aqui.
Porém, todo carnaval
tem seu fim e você não pode mais ser assim.
Chegou o dia de partir. E levar com você os longos conceitos, personas, grids,
guides e certezas. Os gurus, a arrogância, os prêmios individuais, as fórmulas
e palavras da vez.
E o motivo é simples: ali fora tem um mundo que acontece, muda e se reorganiza
em tempo real.
Onde as coisas acabam sendo líquidas, perecíveis, mutantes.
Onde não temos certezas de nada e
quando temos, muitas vezes temos que rever rapidamente nossas convicções.
Uma cultura que cada vez mais se
pluga na diversidade e no conceito do “ser e não ser”. Tudo ao mesmo tempo.
A lógica do “e” e não do “ou”. Onde fica difícil definir e encaixar as coisas
em uma categoria. Onde o rádio passa a ser transmitido em vídeo, onde a pessoa
é ao mesmo tempo executiva, chef, pai/mãe, artista, empregado, tem projeto
paralelo. Circula entre seus papéis e seus mundos.
Mundo que a internet é parte do
ar. E do corpo. Full time.
Mundo de excessos de escolhas, informações, dispersões, verdades e mentiras,
que se transformam rapidamente em mentiras e verdades.
Mundo plural, falível, de tentativa e erro... e tentativa.
Se o velho jeito de
planejar não funciona mais, temos que pegar todo legado que ele deixou e plugar
nas coisas que começam a fazer mais sentido.
Se desplanejar.
Ser mais unplanned do
que nunca, mudando o jeito de fazer em 12 movimentos:
Com a complexidade das variáveis e assuntos ficou impossível fazer coisas sozinho, com as velhas convicções. Vivemos um tempo de falência dos gênios da lâmpada. Saber viver coletivamente, dividir suas ideias e permitir que pessoas com outras visões a complementem é fundamental para criar algo que funcione.
Planejar na essência é o oposto: controle, certeza, garantia. Utopia pura. O jogo hoje é muito mais sobre a sensibilidade de se permitir e abraçar o caos do que em surtar para tentar ter controle sobre tanta coisa acontecendo ao mesmo tempo. Invés de se desesperar, use esse dashboard de informações e excessos pra olhar o que nunca ninguém olhou. O caos tem o lado positivo de te levar onde você não pensava em ir.
Desde os irmãos Winklevoss aprendemos que não dá mais tempo de buscar a perfeição nos planos em papel. A ordem é fazer. Vale mais uma ideia meia boca, mas feita... que uma ideia perfeita mas no papel. Feito é melhor que perfeito.
A falha sempre foi associada com um mau plano. Mas isso surge com ideia de começo meio e fim. Num mundo beta, nada tem fim. Logo, a falha é parte do próximo passo e possível acerto. Não podemos sofrer com a falha, e nem ignorá-la. Tempo de prototipar e aprender. Prototipar de novo. E aprender de novo.
As pesquisas se contradizem. As pessoas não são uma coisa só. Muito difícil colocar caixinhas e definir as coisas com limites tão claros. As verdades caem. Movimentos de igualdade são a tônica do mundo. Ficar abraçado na mesma ideia de sempre é fracassar junto. Dica: quando tiver certeza sobre algo, tente pensar sempre: “e se...” e veja se algum outro ponto de vista acontece.
Só tem um jeito da gente se envolver com algo: sentir que é nosso, que fazemos parte. Ninguém se garante mais pela carreira. Nossa carreira não se constrói com empregos mas com o somatório dos projetos que nos plugamos. Não faça somente o que te mandam fazer, faça o que vai te fazer querer aquilo de novo. Se não der de primeira, aguente firme e use essa energia reprimida para outros projetos e ideias. Planos b, c, d, e, f...
Nosso mundo é digital e será mais. Não brigue com isso. Aprenda... Se abra. Mas cuidado, não esqueça que por trás de cada tela e algoritmo tem uma pessoa. E essa pessoa vai continuar vivendo, comendo, dormindo, beijando, chorando... Humanizar o digital é se diferenciar no mundo dos engenheiros e tecnologias também copiáveis. Já parou pra pensar por que uma startup dá certo e outra não? Umas resolvem mais a vida das pessoas que as outras. Olhe para o desejo delas. E coloque o digital (e dados) à serviço disso.
Cuidado para seu multitask não ser uma sucessão de tasks mal feitas. Faz tudo, não faz nada. Está em todo lugar e não está em lugar nenhum. Tem o mundo aos pés, e não tem ninguém. Tenha muito cuidado naquele momento que seu dedo mágico vai automaticamente ao app social da vez e você perde horas ali enquanto tinha algo mais importante para fazer. O próprio cérebro precisa que você conclua tarefas pra que se sinta bem, vencedor, fazedor. Termine suas coisas.
Todo mundo ta respirando nas mesmas fontes. A viralização rápida das coisas faz todo mundo ter o mesmo repertório e assunto. Será que não está na hora de buscar em outras fontes? Buscar a informação mais longe? Ter o pensamento nada óbvio, que flerta com o impossível ou improvável? Mindfulness? (Obs: amei um livro chamado “Economia dos Desajustados” que é sobre os exemplos que vem de lugares que não olhamos).
Quando a coisa muda rapidamente, você tem 2 opções: negar ou se associar. Pare e pense 5 minutos sobre: business intelligence, big data, ux, tecnologia, cultura, neurociência, cauda longa, globalização, tempo real... Deve ter concluído o mesmo que eu: cole neles. Hoje!
No século passado a gente dava um jeito da pessoa querer o nosso produto. Qualquer produto. Hoje é outro jogo: temos fazer produtos que as pessoas realmente queiram. As pessoas tem muitas opções, não caem em discursos baratos que não as atenda. As técnicas de “human centered design” nos levaram pra outro patamar. Para sobreviver, tem que fazer algum sentido.
Empate é coisa de perdedor. Os dias de hoje foram projetados pra quem querendo ganhar, arrisca perder. Eu tenho certeza que algum “sobrinho da internet” levou um aplicativo para alguma cooperativa de táxi e foi ignorado. Risco... Quem ta tentando algo novo? Quem assume o risco (de preferência calculado)? Marcas, startups e pessoas vencedoras no dia de hoje são as que assumiram risco.
Falar é fácil, eu
sei.
Mas fazer é necessário.
Não temos opção.
Como já dito no artigo anterior, esse mundo me dá medo e tesão.
Quase ao mesmo tempo.
Acredito profundamente nessa mudança de mindset. Faz tempo.
Bom, meu projeto não se chama-se planned e sim Unplanned.
Se o planejamento sempre existiu pra transformar as coisas, começar pela gente
mesmo é um belo e possível primeiro passo.
Vamos nos desplanejar?